Este é o vigésimo segundo texto da série de análises contextualizadas de cada um dos estados brasileiros, no especial “Os governos estaduais e as ações de enfrentamento à pandemia no Brasil”, publicado entre os dias 8 e 12 de junho na página da ABCP. Acompanhe!
Este é o vigésimo segundo texto da série de análises contextualizadas de cada um dos estados brasileiros, no especial “Os governos estaduais e as ações de enfrentamento à pandemia no Brasil“, publicado entre os dias 8 e 12 de junho na página da ABCP. Acompanhe!
Sergipe: lockdown versus retomada das atividades comerciais
Nome dos autores e instituição a que estão vinculados: Rodrigo Barros de Albuquerque e Cairo Gabriel Borges Junqueira (Universidade Federal de Sergipe – UFS)
Titulação dos autores e instituição em que a obtiveram: Doutor em Ciência Política (UFPE); Doutor em Relações Internacionais (PPGRI San Tiago Dantas – UNESP)
Região: Nordeste
Governador (Partido): Belivaldo Chagas (PSD)
População: 2.278.308 (2018)
Número de municípios: 75
Casos confirmados em 09/06/2020: 10.126
Óbitos confirmados em 09/06/2020: 252
Casos por 100 mil hab.: 444,5
Óbitos por 100 mil hab.: 11
* Por: Rodrigo Barros de Albuquerque e Cairo Gabriel Borges Junqueira
No primeiro texto a respeito de Sergipe desta série de análises sobre o papel dos governos estaduais face à pandemia de COVID-19, foram apresentados dados referentes ao período do dia 14 de março, data da notificação do primeiro caso no estado, até o final de abril. Até então, com informações do dia 30 daquele mês, Sergipe apresentava 453 casos confirmados da doença, mais da metade deles concentrada na capital, Aracaju.
Naquele momento, foi enfatizado que havia consonância entre os trabalhos realizados pelas autoridades públicas de diferentes níveis governamentais, tanto locais quanto estaduais, além da própria Universidade Federal de Sergipe (UFS), única universidade pública do estado, com mais de 30 mil discentes, ter paralisado quase todas as suas atividades presenciais como modo de contenção da pandemia.
O final de abril já sinalizava a necessidade de maior compromisso da sociedade com o isolamento social, especialmente para evitar o colapso do sistema de saúde. Desde então, ocorreram desdobramentos importantes sobre essas questões, como se verá a seguir.
No período que compreende todo o mês de maio até o dia 10 de junho, houve aumento considerável do número de casos confirmados de COVID-19 no estado, ocorrendo movimento similar à “curva em J”, ou seja, a doença avançou rapidamente de 517 casos confirmados e 14 óbitos, em 01/05, para 10.126 casos confirmados e 252 óbitos em 09/06.
Mais da metade dos casos confirmados e pouco menos da metade dos óbitos se concentra em Aracaju, mas é possível observar uma interiorização da doença em Sergipe, com apenas um município sem nenhum caso confirmado, Pedra Mole. Dos 75 municípios, 73 já decretaram estado de calamidade pública, começando ainda em abril. Essa interiorização é visível, por exemplo, em cidades como Nossa Senhora do Socorro, São Cristóvão e Barra dos Coqueiros, circunscritas à região metropolitana, as quais acumulam mais de 1.300 contaminados até 10/06.
Essa alta acumulada no período representou um aumento da ocupação de leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) e de enfermaria. Há atualmente 209 leitos de UTI disponíveis para tratamento da COVID-19, dos quais 153 estão ocupados.
No âmbito privado, a taxa de ocupação atingiu a marca de 96,3%, o que não ocorreu com a mesma intensidade na esfera pública em virtude da construção de hospitais de campanha, embora também tenha ocorrido acréscimo nas lotações das unidades de saúde públicas. Em 09/06, Sergipe conta com taxa de mortalidade de 11 mortes por 100 mil habitantes, abaixo da média nacional de 18,3 por 100 mil habitantes.
Nesse contexto, emerge uma situação paradoxal: embora a taxa de crescimento de casos confirmados e óbitos seja bastante elevada, com índices de ocupação total das UTI em torno dos 70% no total, os índices de mortalidade ainda são baixos.
No Twitter, o governador Belivaldo Chagas reforça essa dualidade, avultando o fato de o estado ter aumentado em quase cinco vezes os leitos de UTI, mas alertando para a tendência de crescimento que sugere um futuro breve no qual não haverá capacidade hospitalar suficiente para atender à população. Assim, Chagas segue reiterando o discurso do “Fique em casa!” para os sergipanos em suas redes sociais e nas contas oficiais do governo.
Em relação ao último ponto, o quadro que se instala em Sergipe aparenta ser de grande oposição de perspectivas e leituras acerca da pandemia. Ainda no final de abril, o cientista Miguel Nicolelis, coordenador dos trabalhos do Comitê Científico de Combate ao Coronavírus do Consórcio Nordeste (C4NE), afirmou que o afrouxamento do distanciamento social no estado era uma de suas principais preocupações e que isso estava fazendo-o “perder o sono”.
Passado mais de um mês, o oitavo boletim do C4NE publicado no dia 01 de junho apontou duas preocupações centrais em relação a Sergipe. Em primeiro lugar encontra-se a inquietação a respeito de Aracaju, que entrou no grupo de cidades que deveriam aderir a um plano de isolamento rígido mais próximo de um lockdown.
Em segundo, ressalta-se o aumento dos casos de COVID-19 no interior, mencionando-se as já citadas cidades da região metropolitana, além de Lagarto, município que contava no início de junho com quase 200 casos confirmados e, em 09/06, tem 210 casos confirmados.
Em contrapartida, há a leitura de maior flexibilização da quarentena com reabertura gradual do comércio. Os maiores índices de isolamento social sergipano ocorreram no final de março com uma taxa de quase 60%.
Contudo, posteriormente esse número começou a cair, alcançando a média de 40% no final de maio e um índice de 36,4% em 09/06, sexto pior índice do país. Essa queda não acontece somente no estado, mas representa uma tendência nacional na qual prefeitos e governadores estão, progressivamente, aderindo à reativação dos setores comerciais.
Nesse aspecto, o setor de turismo, muito forte no estado e principalmente em Aracaju, foi extremamente abalado. O setor de restaurantes e similares é o que apresenta a maior queda em relação à emissão de notas fiscais, representando uma redução de 72,93% em março em comparação com o mesmo mês de 2019.
Especificamente na capital, sobretudo nos bairros circunscritos à região litorânea e de praias, já é visível o impacto da pandemia, com projeções de que cerca de 300 bares devem encerrar suas atividades no futuro próximo.
No início de junho, empresários apresentaram ao governador um plano de reabertura gradual da economia, com fases progressivas. Em seguida, Belivaldo Chagas divulgou em 04/06 um plano estadual de retomada das atividades, seguindo os mesmos princípios do plano apresentado pelos empresários, com o reinício gradual por etapas de setores específicos. Em 08/06, o governador prorrogou as medidas de distanciamento social até 15/06, ainda com o objetivo de retomar as atividades.
É nesse cenário dual que Sergipe está lidando com a pandemia do novo coronavírus. Desde meados de março, após a descoberta do primeiro caso, não houve em momento algum uma taxa de isolamento social considerada ideal de, no mínimo, 70%. O esforço das autoridades é visível em termos de construção de hospitais de campanha e aumento do número de leitos, mas com a tendência de crescimento do número de casos, as projeções não são otimistas, podendo haver lotação dos centros de saúde e carência de atendimento em futuro próximo.
Destaca-se o fato do Governo de Sergipe ter mudado recentemente a forma de divulgação de informações sobre a pandemia no estado em sua conta oficial no Instagram. No início, houve uma tentativa de apoiar maiores níveis de isolamento social, reafirmando a necessidade de as pessoas ficarem em casa. Em um segundo, e de modo mais recente, já há vinculação nominal, incluindo fotos de pessoas que morreram em virtude da COVID-19, com o intuito de causar maior impacto na sociedade.
Com a piora no índice de isolamento observada no início de junho e a provável reabertura do comércio, parece que a tendência é por uma ascensão contínua e vertiginosa dos casos no estado, sobrecarregando a rede hospitalar e, consequentemente, elevando o número de óbitos.