ESPECIAL ABCP: As ações do Espírito Santo no enfrentamento à pandemia

Este é o sétimo texto da série de análises contextualizadas de cada um dos estados brasileiros, no especial “Os governos estaduais e as ações de enfrentamento à pandemia no Brasil”, publicado entre os dias 8 e 12 de junho na página da ABCP. Acompanhe!

Este é o sétimo texto da série de análises contextualizadas de cada um dos estados brasileiros, no especial “Os governos estaduais e as ações de enfrentamento à pandemia no Brasil“, publicado entre os dias 8 e 12 de junho na página da ABCP. Acompanhe!


A pandemia do novo coronavírus no Espírito Santo: flexibilização e vigilância

Nome do autor e instituição à qual está vinculado: Paulo Magalhães Araújo, Universidade Federal do Espírito Santo (UFES)

Titulação: Doutor em Ciência Política pela Universidade Federal de Minas Gerais

Região: Sudeste

Governador (Partido): Renato Casagrande (PSB)

População: 4.018.650

Número de municípios: 78

Casos confirmados em 08/06/2020: 20.659

Óbitos confirmados em 08/06/2020: 871

Casos por 100 mil hab.: 488

Óbitos por 100 mil hab.: 20,7


* Por: Paulo Magalhães Araújo

Em 08/06/2020, o número de casos de contágio por coronavírus confirmados no estado do Espírito Santo chegou a 20.659 e o número de óbitos a 871. Segundo dados da Secretaria Estadual de Saúde, o total de casos por 100 mil habitantes foi de 514; o número de óbitos por 100 mil habitantes é de 21,7.

Para enfrentar este cenário crítico, a rede hospitalar do estado conta com 1.248 leitos, sendo 610 de UTI e 638 de enfermaria. A taxa de ocupação dos leitos de UTI é de 83,1% e de enfermaria é de 63,6. No total, 73,2% dos leitos estão ocupados. A taxa de letalidade da Covid-19 no estado é de 4,2%. A taxa de transmissão no estado é de 1,8, significando que cada dez doentes transmitem a doença para 18 pessoas. O estado monitora também o nível de isolamento social, a partir de parceria entre o governo e empresas de telecomunicações. Considerado o período desde o início da medição, em 13/04, o nível médio de isolamento está em 48,6%.

No início da pandemia, o governo estadual impôs medidas restritivas do contato social, em acordo com as diretrizes das autoridades sanitárias nacionais e internacionais. Governo do estado e governos municipais atuaram em convergência nos tempos iniciais da crise. As sinalizações em contrário, expressas no comportamento do presidente da República, não surtiram efeitos nas diretrizes adotadas no estado.

Foram publicados decretos estaduais regulando as atividades do comércio, impondo normas restritivas que permitiam apenas o funcionamento de atividades consideradas essenciais como supermercados, farmácias, açougues e postos de combustível.

Atividades em shoppings, academias de ginástica e todo o comércio considerado não essencial, assim como as aulas nas escolas públicas e privadas, foram suspensas. Em muitos estabelecimentos, o comércio era permitido apenas por delivery ou drive thru. Esse quadro, no entanto, começou a ser revertido, frente a pressões dos empresários e comerciantes e de algumas prefeituras do interior do estado.

Fato é que nos últimos dias, sob pressão, as medidas de restrição social foram gradativamente flexibilizadas. Para orientar o governo em direção à flexibilização, elaborou-se o que se chama de matriz de risco, que classifica os municípios como de risco baixo, moderado, alto ou extremo.

Essa classificação passou a ser adotada a partir de 24/05/2020 e leva em consideração a taxa de incidência de casos confirmados nos municípios, a taxa de ocupação dos leitos de UTI, os índices de isolamento social e de letalidade da doença, além do percentual da população acima dos 60 anos – considerada grupo vulnerável. 

Com essa nova política, os municípios de risco baixo e moderado foram liberados – ainda que sob monitoramento constante – para reabrirem o comércio e retomar as atividades sociais (exceto aulas presenciais, que estão suspensas pelo menos até o fim de junho em todo o estado).

Mas mesmo aos municípios com risco alto foi permitida considerável flexibilização: Vitória, Vila Velha, Serra, Cariacica Viana, Fundão, Santa Teresa e Presidente Kennedy. Nesses municípios, em que pese o nível de risco, está permitida a abertura dos shoppings e das academias de ginástica de forma controlada; bem como do comércio varejista, em horários limitados, e dias alternados de acordo com os produtos que oferecem.

A matriz de risco se, por um lado, permite uma diretriz que orienta a abertura gradual do comércio e a retomada dos contatos sociais, por outro, deixa em suspenso a possibilidade de lockdown, em caso de o risco de contágio chegar ao nível extremo em determinado município ou região do estado.

O fato é que as falas das autoridades estaduais têm por vezes apontado em direções opostas, criando dúvidas: ora se sinaliza para a abertura gradual e segura, ora para o fechamento total em decorrência do aumento do risco de contágio e internações que podem superlotar os hospitais e, no limite, colapsar o sistema de saúde.

Importa ressaltar que o sistema de saúde no Estado como um todo, e na região metropolitana em particular, beira uma situação crítica. A epidememia está em ascensão no estado; ainda não chegou ao topo. Isso se observa particularmente na região metropolitana, onde a taxa de ocupação dos leitos de UTI chega a 89,4%.

De olho neste dado, o governo estadual decretou a obrigatoriadade do uso de máscaras por todos e flerta com o lockdown, deixando inquietos os empresários e comerciantes da região e deixando a sociedade confusa. Segundo um importante jornal do Estado “os sinais emitidos pelos secretários [do estado] têm sido trocados, às vezes contraditórios.

Lá na ponta (os cidadãos), que no fim é o que importa, a mensagem não tem chegado de maneira clara e uniforme, e o resultado se observa nas conversas privadas. As pessoas estão cheias de dúvidas: afinal estamos caminhando em direção a um lockdown ou a uma maior abertura?

Outra característica notória da estratégia de enfrentamento à Covid-19 adotada no estado é a tentativa do governo de dividir a responsabilidade entre o poder público e a sociedade em geral. Em entrevista recente (24/05/2020), o governador Renato Casagrande afirmou: 

“É preciso diminuir a interação entre as pessoas. A doença está no nosso calcanhar, prestes a nos alcançar. Para não termos de tomar medidas mais drásticas de paralisação de todas as atividades, é importante que cada um contribua. É preciso muita atenção dos gestores municipais, mas também das pessoas desses municípios, para diminuir o grau de risco. O isolamento depende de cada um e, se tivermos essa disciplina pessoal, manteremos um resultado coletivo de também reduzir a pressão sobre o sistema hospitalar” (grifos acrescentados). 

Em suma, com o contágio e o número de mortes batendo records, as decisões do governo capixaba acerca do combate ao coronavírus refletem tensões entre o controle da pandemia, por um lado, e a flexibilização controlada, por outro.

Alguns prefeitos anseiam pela flexibilização. As pessoas descumprem o isolamento e lotam várias praias. Empresários e representantes dos shoppings pressionam pela abertura… E o governo, por seu lado, se preocupa com o esgotamento da rede hospitalar e a necessária contenção da pandemia.

Ao que parece, na iminência de alguns municípios entrarem na faixa do risco extremo, essa tensão dará a tônica do enfrentamento da pandemia no Espírito Santo nos dias que estão por vir.

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