Este é o quarto texto da 5ª edição do especial “Os governos estaduais e as ações de enfrentamento à pandemia no Brasil”, publicado entre os dias 8 e 12 de fevereiro na página da ABCP. Acompanhe!
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A conta chegou em Minas Gerais
Nome dos(as) autores(as): Larissa Peixoto Gomes; Thiago Silame e Helga Almeida
Instituições às quais os(as) autores(as) estão vinculados(as): Institute for Globally Distributed Open Research and Education (IGDORE); Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL); Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF)
Titulação: Doutoras e doutor em Ciência Política, titulados pela Universidade Federal de Minas Gerais
Região: Sudeste
Governador (Partido): Romeu Zema (Novo)
População: 21.168.791 (IBGE, 2019)
Número de municípios: 853
Casos confirmados em 29/01/2021: 721.967
Óbitos confirmados em 29/01/2021: 14.819
Casos por 100 mil hab.: 3.382,18
Óbitos por 100 mil hab.: 69,44
Data de início do Plano de vacinação: 18/01/2021
Acesse aqui o Plano de vacinação do estado
* Por: Larissa Peixoto Gomes; Thiago Silame e Helga Almeida
A conta chegou em Minas Gerais e ela é alta. O estado apresentou em janeiro recordes diários de números de casos de covid-19. Consequentemente, houve alta nos números de mortes pela doença que superam as estatísticas de meados de 2020 (quando o país e o Estado alcançaram os mais elevados números de casos e mortes).
Hoje, Minas Gerais é o segundo estado em número de casos, são 715.967 [1] pessoas contaminadas, só perdendo para São Paulo, e o terceiro em número de óbitos absolutos 14.699 [2]. Pode-se ver nas tabelas abaixo as curvas indicativas de novos casos. Nessas fica claro como o número de novos casos aumenta visivelmente de patamar em Minas no fim de 2020 e começo de 2021.
Além disso, no gráfico abaixo é saliente o crescimento do registro de novos óbitos em MG.
Pensando nas vinte maiores cidades mineiras e o avanço da covid, destacam-se pelo aumento do número de novos casos as cidades de Belo Horizonte, Juiz de Fora e Varginha.
Em relação ao número de novos óbitos em 2021 destacam-se as cidades de Belo Horizonte, Juiz de Fora, Varginha e Ipatinga.
Em boa medida, os números apresentados no início deste ano no estado acompanham uma tendência de alta observada no país. Um dos fatores que explicam a alta dos números está relacionado ao comportamento de cidadãs e cidadãos que ignoraram as recomendações científicas de manter isolamento social e uso de máscaras. Imagens de brasileiros comemorando a virada do ano correram o mundo e causaram perplexidade e espanto. Contudo, muito do modo de agir percebido na população é reflexo de políticas públicas no nível federal e estadual pouco assertivas e claras na indicação à sociedade de quais os riscos do vírus, a evolução dos dados acerca de contágios e óbitos e quais os procedimentos adequados para se proteger do novo coronavírus.
Dentro das políticas públicas afrouxadas produzidas está a flexibilização das medidas de isolamento social em vários estados e cidades do país.
Além disso, outros fatores relacionados à adoção ou não de políticas públicas de enfrentamento da pandemia em MG podem ser acionados para explicar o atual cenário observado no estado.
Em artigos anteriores, apontamos uma série de pontos que dificultava o enfrentamento da doença no estado. Retomemos alguns deles. O primeiro é o alinhamento do governador Romeu Zema (Novo) ao presidente Bolsonaro e seu desalinhamento em relação ao prefeito de Belo Horizonte. Alexandre Kalil (PSD). Zema se mantém, como Bolsonaro, um contumaz sabotador das medidas de enfrentamento à pandemia com sua postura negacionista em relação à ciência [7], enquanto Kalil vem adotando medidas de restrição de circulação de pessoas e de fechamento do comércio sempre que os indicadores sanitários alcançam números críticos. O resultado destes desencontros é a falta de uma ação coordenada para o enfrentamento da pandemia no Estado.
Um segundo ponto a destacar são ações equivocadas do governo de MG em relação à pandemia. Destacamos a subnotificação de casos, a ineficiente política de testagem no estado, a montagem de um hospital de campanha que não recebeu sequer um paciente. Por fim, temos a ineficiência comunicativa e operacional do programa “Minas Consciente”. Seu foco é a atividade econômica e não a adoção de medidas sanitárias que possibilitem o controle da doença no Estado.
Assim sendo, o governo de MG não veiculou nenhuma peça publicitária voltada para a população do estado recomendando o distanciamento social, adoção de medidas de higiene e uso de máscaras em público. O foco recai nas atividades econômicas.
Finalmente, temos a ineficiência da administração de Zema em usar o aparato existente em Minas Gerais para atender a população, inclusive na produção de vacinas para a covid-19. Lembrando da sofrível entrevista pré-eleição em que ele admite não saber o que é a Fundação Ezequiel Dias (FUNED), o governo de Zema não somente isolou uma instituição que trabalha há 113 com medicamentos incluindo produção de vacinas, mas propositalmente destruiu relações comerciais e diplomáticas durante a negociação para aquisição direta de vacinas para o estado [8].
Em relação à vacinação, o estado de MG não criou nenhum plano específico e vai seguir o Plano estipulado pelo governo federal evidenciando mais uma vez seu alinhamento ao governo Bolsonaro [9]. A imunização no estado começou no dia 19 de janeiro. Segundo dados da Secretaria Estadual de Saúde de MG (SES-MG) relativos ao dia 28 de janeiro, foram distribuídas 496.160 doses de vacinas para os municípios mineiros e aplicadas 115.219 doses [10]. O estado já recebeu três remessas de vacinas do governo federal, totalizando 855.888 vacinas (Quadro 1).
O Plano Nacional de Imunização (PNI) brasileiro é reconhecido internacionalmente pela sua capacidade de cobertura e alcance – considerando o tamanho continental do país. Contudo, em função da descoordenação da política de imunização nacional contra o coronavírus, caracterizada pela incerteza em relação à aquisição de vacinas disponíveis no mercado e da sua distribuição equitativa para os entes federados, vários governadores de estado e prefeitos criaram seus próprios planos de vacinação e passaram a negociar com laboratórios e farmacêuticas a aquisição dos imunizantes. Ao se alinhar a Bolsonaro, o estado de MG fica refém da incerteza e sem saber ao certo quando teremos vacinas em quantidade suficiente para imunizar um percentual suficiente de pessoas para se criar um cordão sanitário capaz de conter a epidemia.
Enquanto isso, o prefeito da capital luta contra associações comerciais para tentar diminuir aberturas de espaços públicos, especificamente, comércio não-essencial, na cidade com o maior número de bares e botecos per capita do país. O exemplo de Manaus parece não sensibilizar os comerciantes da capital mineira e muito menos o governador do estado. O apoio do governo do estado seria chave para manter uma das maiores cidades do país organizada no sentido de contornar a pandemia, mas o empresário-governador parece não saber que existe a Fundação João Pinheiro também, onde poderia ter algumas aulas sobre administração pública. Diante do cenário aqui exposto a conta chegou e é cara. Ela é paga com a vida de cidadãs e cidadãos mineiros.
Referências bibliográficas:
[1] Dados de 29 de Janeiro de 2021. Fonte: https://covid19br.wcota.me/
[2] Dados de 29 de Janeiro de 2021. Fonte: https://covid19br.wcota.me/
[3] Acesso em 29 de janeiro de 2021. https://covid19br.wcota.me/
[4] Acesso em 29 de janeiro de 2021. https://covid19br.wcota.me/
[5] Acesso em 29 de janeiro de 2021. https://covid19br.wcota.me/
[6] Acesso em 29 de janeiro de 2021. https://covid19br.wcota.me/
[7] Em estudo realizado pelo Lowy Institute de Sydney que avalia a forma como países enfrentaram a pandemia de COVID-19 o Brasil apresentou o pior desempenho. Foram avaliados 98 países. Disponível em: https://www.em.com.br/app/noticia/nacional/2021/01/28/interna_nacional,1233008/brasil-e-o-pior-do-mundo-no-combate-a-covid-aponta-estudo.shtml. Acessado em 28 jan. 2021
[8] Acerca da aquisição de vacinas pelo governo de MG a matéria disponível no link é ilustrativa da incompetência do atual governo. <https://www.em.com.br/app/noticia/politica/2021/01/28/interna_politica,1232967/governo-de-mg-perdeu-vacina-chinesa-apos-gafe-diplomatica-e-dialogo-lento.shtml>. Acessado em 28 jan. 2021.
[10] No link https://vacinaminas.mg.gov.br/wp-content/uploads/2021/01/distribuicao-doses.pdf disponibilizado pela SES-MG é possível verificar o quantitativo de doses destinadas para cada Regional de Saúde no Estado. Acessado em 28 jan. 2021.