Este é o vigésimo texto da 4ª edição do especial “Os governos estaduais e as ações de enfrentamento à pandemia no Brasil”, publicado entre os dias 24 e 28 de agosto na página da ABCP. Acompanhe!
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Do combate ao coronavírus ao enfrentamento de setores econômicos: notas sobre a pandemia no Ceará
Nome dos(as) autores(as) e instituição a que estão vinculados(as): Monalisa Lima Torres e Emanuel Freitas da Silva – Universidade Estadual do Ceará (UECE)
Titulação dos(as) autores(as) e instituição em que a obtiveram: Doutorado em Sociologia – Universidade Federal do Ceará (UFC)
Região: Nordeste
Governador (Partido): Camilo Santana (PT)
População: 8.843 habitantes
Número de municípios: 184
Data do registro do primeiro caso no estado: 15 de março
Data do primeiro óbito no estado: 26 de março
Casos confirmados em 27/08/2020: 209.363
Óbitos confirmados em 27/08/2020: 8.362
Casos por 100 mil hab.: 2.351,22
Óbitos por 100 mil hab.: 93,91
Decreto estadual em vigor no dia 27/08/2020: Decreto n° 33.722, de 22 de agosto de 2020
Índice de isolamento social no estado em 25/08/2020: 39,4%
* Por: Monalisa Lima Torres e Emanuel Freitas da Silva
Tendo figurado pelo primeiro trimestre da pandemia entre os três estados com maior número de casos e óbitos por covid-19, o Ceará atravessou os meses de junho e julho com considerável diminuição dos números relacionados à pandemia, o que possibilitou o deslocamento do foco de atenção para a retomada de atividades econômicas e de algumas outras que não haviam sido consideradas como essenciais, conforme pontuamos em boletim anterior [1]. Exatamente por isso, com exceção de academias, barracas de praia, instituições de ensino e cinemas, as outras categorias de serviços tiveram suas atividades retomadas seguindo as fases de reabertura indicadas no Plano de Retomada Responsável das Atividades Econômicas e Comportamentais (Decreto Nº 33.722/2020) proposto pelo governo do Ceará.
Se os dois referidos meses apresentaram números alarmantes de casos confirmados e óbitos nas cidades do interior, o mês de agosto, em linhas gerais, trouxe uma maior tranquilidade ao governo do estado no que diz respeito à condução da crise de saúde e da crise econômica que se abateu sobre o Ceará, colhendo resultados já promissores na arrecadação estadual (o que possibilitou o adiantamento da primeira parcela do décimo terceiro salário de servidores estaduais), no saldo de 5.727 empregos em julho (maior no Nordeste e sexto no Brasil) e na gestão da saúde, com a chegada dos últimos 700 respiradores, destinados às cidades do interior.
Agosto registrou os menores índices de transmissão de covid-19 no estado, com destaque para a cidade de Fortaleza, o epicentro do contágio. A variável que mede a capacidade que cada pessoa positivada teria para retransmitir o vírus chegou a 0,64 em 13 de agosto. Queda significativa quando comparada ao pico da pandemia em maio, cuja taxa de transmissão chegou a 2,0 no Ceará. Segundo o governador Camilo Santana (PT), o resultado teria sido fruto do empenho do governo em adotar medidas antecipadas para barrar a disseminação do coronavírus, desde a formação de Comitê de Planejamento para Combate à Covid-19 (Decreto nº 33.509/2020), os decretos de isolamento e suspensão de atividades econômicas não essenciais (Decreto nº 33.519/2020) em todo o estado até a ampliação e reestruturação da rede pública de saúde estadual para atender os casos de coronavírus [2]. Até agora, o governo cearense investiu quase R$ 570 milhões no enfrentamento à covid-19.
Apesar dos bons resultados, que possibilitaram a retomada da economia e relaxamento das medidas de restrição de circulação de pessoas (com a reabertura, inclusive, de alguns destinos turísticos, como a praia de Jericoacoara), campanhas publicitárias de conscientização dos cearenses circulam por diversas mídias a fim de evitar novas ondas de contágio, produzidas pelo possível relaxamento, por parte da população, das medidas de proteção social (como cenas reproduzidas em cadeia nacional de aglomerações na Praia de Iracema, com diversas pessoas sem máscaras); junte-se a isso a entrada em vigor da lei estadual nº 17.261 que prevê multa que varia de R$ 100 a R$ 300 àqueles que circularem nas ruas sem o uso de máscaras, bem como a punição a estabelecimentos que não exijam seu uso por parte de frequentadores.
No Cariri, epicentro da pandemia durante os meses de junho e julho, houve o maior crescimento das médias de novos infectados: entre 27 de julho e 4 de agosto, registrou-se evolução de 1,09% de novos casos, enquanto a média estadual foi de 0,58%. Mesmo assim, os índices apresentaram tendência de queda, o que permitiu à região avançar para a fase 2 do plano de reabertura com a permissão para funcionamento de restaurantes em horário reduzido e templos religiosos (com 20% da capacidade).
As macrorregiões de Sobral, Sertão Central e Litoral Leste/Jaguaribe avançam para a fase 3 e Fortaleza e Região Metropolitana permanecem na fase 4, produzindo, na sociedade, uma sensação de “tudo normalizado”. Isso levou governo estadual e Prefeitura de Fortaleza a intensificarem, por meio das polícias, guarda municipal e Agência de Fiscalização de Fortaleza (AGEFIS), fiscalização em estabelecimentos comerciais e academias que descumprissem as normas de biossegurança. Além do monitoramento de praias, que têm se tornado pontos de aglomerações sobretudo nos finais de semana, a Polícia Militar já encerrou festas clandestinas na capital.
O debate pelo retorno das aulas presenciais no Ceará
Novo enfrentamento com o governador foi produzido por dois setores econômicos que têm reclamado o restabelecimento de suas atividades: bares e ensino privado. Os primeiros, até a data de produção desse texto, ainda não haviam sido incluídos no plano de funcionamento junto aos restaurantes, gerando uma série de reclamações de proprietários com ameaças de falência. Quanto aos segundos, uma série de mobilizações, que vão desde a publicidade em jornais de circulação local, outdoors até à realização de carreatas e aulas públicas, têm sido levadas a cabo pelo sindicato das escolas privadas. A campanha “pelo direito de decidir”, buscando legar aos pais o direito de levar ou não seus filhos para escolas, tem dado a tônica dos movimentos de reivindicação da retomada das aulas, que, segundo o plano de reabertura da economia, estava prevista para voltar em julho. O governador, a cada pronunciamento, mostra-se mais decidido pelo adiamento do ensino presencial, gerando mais insatisfação no setor, que tem recebido apoio de deputados e vereadores de oposição.
A pressão se justifica pelo número de escolas que perderam matrículas ou que estão sob risco de falência em razão da pandemia. Para se ter uma ideia, as escolas da rede privada em Fortaleza tiveram mais de 80% de cancelamentos de matrícula, a maioria creches e escolas de educação infantil, que correspondem a 40% do segmento e que encerraram em definitivo as atividades. Com a necessidade de investir em adaptações estruturais para atender às demandas de biossegurança, a pandemia provocou aumento da inadimplência e resultou em demissões que chegam a 30% dos funcionários do setor. Cenário que se acentua quando se consideram escolas de médio e pequeno porte não apenas na capital.
O segundo semestre letivo de 2020 já foi retomado no Ceará (rede pública e privada), mas apenas na modalidade à distância. Nas escolas da rede pública estadual, as aulas iniciaram no dia 10 de agosto. A Secretaria de Educação do Ceará (SEDUC) prepara plano de retomada do ano letivo presencial na rede estadual. Profissionais da educação da rede municipal de Fortaleza receberam férias coletivas no mês de agosto enquanto as unidades de educação passam por intervenções para garantir o retorno às aulas presenciais.
Em 26 de agosto, Dr. Cabeto, titular da Secretaria de Saúde (SESA), afirmou que o governo estuda plano de retomada das aulas presenciais no Ceará por faseamento e prevê testagem em massa para alunos e funcionários das instituições de ensino. Pela proposta, as atividades presenciais devem iniciar em setembro.
Por fim, no plano da sociedade, enquanto igrejas evangélicas, que se mobilizaram intensamente (sem êxito) para sua inclusão entre os “serviços essenciais” ainda no mês de maio, voltaram às atividades, obedecendo aos protocolos das autoridades sanitárias; a igreja católica, sob a liderança do arcebispo de Fortaleza, Dom José Antônio, tem permanecido de “portas fechadas” mesmo com o avançar das fases de retomada em Fortaleza. Segundo Antônio, é preciso esperar mais para se ter a certeza de que os perigos de contágio estão sob controle. Assim, a Caminhada com Maria, evento que reúne anualmente quase 2 milhões de católicos e que está inscrito entre os eventos oficiais do estado, teve sua realização de modo virtual.
Referências bibliográficas:
[1] Para ver Boletim 03, acesse https://cienciapolitica.org.br/analises/especial-abcp-3a-edicao-estados-regiao-nordeste/artigo/especial-abcp-acoes-ceara-enfrentamento-pandemia
[2] Ver mais informações em https://politica.estadao.com.br/blogs/gestao-politica-e-sociedade/ceara-apos-a-estabilidade-na-capital-os-desafios-da-retomada-da-economia1/