Este é o vigésimo quarto texto da 5ª edição do especial “Os governos estaduais e as ações de enfrentamento à pandemia no Brasil”, publicado entre os dias 8 e 12 de fevereiro na página da ABCP. Acompanhe!
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A pandemia e o longo delírio regional
Nome do autor: Cristovão Henrique Ribeiro da Silva
Instituição: UFAC (Universidade Federal do Acre)
Titulações do autor e instituições em que as obteve: Doutor em Geografia Econômica pela UFGD (Universidade Federal da Grande Dourados) e pós-doutor em Geoeconomia pela UFG (Universidade Federal de Goiás)
Região: Norte
Governador (Partido): Gladson Cameli (PP)
População: 881.935
Número de municípios: 22
Casos confirmados em 04/02/2021: 49.944
Óbitos confirmados em 04/02/2021: 882
Casos por 100 mil hab.: 5.663,0
Óbitos por 100 mil hab.: 100,00
Data de início do Plano de vacinação: 19 de janeiro
Acesse aqui o Plano de vacinação do estado
* Por: Cristovão Henrique Ribeiro da Silva
Estamos para completar um ano de pandemia de covid-19 no Brasil, uma crise sanitária sem precedentes na história recente do país. Continuamos na contagem de mais de duas centenas de milhares de mortes evitáveis sob a batuta do escárnio protagonizado pelo presidente da República Jair Bolsonaro (sem partido). A cruzada negacionista que o Brasil se enveredou, capitaneada pelo governo federal, ignorou todas as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS), dos virologistas e epidemiologistas que deram, no início da pandemia, as coordenadas de como conter o contágio no novo coronavírus (SARS-CoV-2).
Ao longo desses meses, vimos os países tentando se organizar em torno de estratégias que deveriam implementar para buscarem o achatamento da curva epidemiológica, no sentido de reduzir stress do sistema de saúde e funerário, assim, os gestores públicos ao redor do mundo conseguiriam o mínimo de convívio social, com os protocolos de biossegurança, até que desenvolvêssemos as vacinas. Em contrapartida, mesmo com os números altíssimos de casos e óbitos causados pela covid-19, o Brasil insistiu e insiste nos passos de uma dança equivocada e no escuro entre a habilidade de conviver com o vírus e a falta de coesão das políticas públicas nos âmbitos federal, estadual e municipal.
Com as eleições municipais país afora, que foram prorrogadas para novembro de 2020 em virtude do contexto pandêmico, associadas às festas de Natal e Ano Novo, deixaram para janeiro de 2021 um custo terrível para as regiões mais desiguais do país: a segunda onda de contágio. Em paralelo a isso, na escala nacional, foi deflagrada a guerra da vacina, com o discurso, até então, antivacina de Jair Bolsonaro, para fazer oposição ao seu rival político, o governador do Estado de São Paulo João Doria (PSDB), que mira as eleições presidenciais de 2022. De todo modo, no final da guerra, após a aprovação de uso emergencial do imunizante pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Doria colheu um saldo político positivo resultante dos embates com o governo federal.
Em meio a tudo isso, são 9,3 milhões de infectados com quase ¼ de milhão de vidas perdidas para a pandemia (Mapa 1) que, no Norte do país, deixou um rastro epidemiológico com uma mutação do novo coronavírus, agora mais transmissível, colocando a comunidade internacional em alerta. Espanha, Portugal, Alemanha, Reino Unido e Estados Unidos restringiram voos originários do Brasil, e, portanto, a mutação do vírus no Amazonas colocou fim ao delírio regional de que o pior da pandemia já tinha passado. O sistema de saúde em Manaus entrou em colapso, em seguida o sistema funerário; o Pará decretou lockdown regional na porção Oeste do estado para desacelerar o contágio que já tinha saído das fronteiras administrativas amazonenses.
Já debatemos o fator regional da pandemia, uma vez que – e, insistimos nesse ponto – é no eixo hidroviário fluvial que as pessoas se deslocam para as metrópoles amazônicas em busca do atendimento já que no interior não há UTIs (Mapa 2). É nesse deslocamento geográfico que se arrastam durante dias e dias embarcações clandestinas abarrotadas de pessoas, sintomáticas e assintomáticas, que os índices de contágio são elevados potencialmente na maior floresta equatorial do mundo.
Com o fim da guerra da vacina e dos lugares, como intitulamos a corrida frenética dos governadores em busca das vacinas, os estados tentam editar medidas de contenção dos casos ascendentes de covid-19, enquanto, no conjunto, o país voltou ao platô único no mundo e trágico de mil mortes/dia, sem auxílio emergencial e com letalidade do vírus em 2,4%.
O Plano Nacional de Imunização (PNI), em meio às trapalhadas do ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, começou a imunização em 22 de janeiro e, até 2 de fevereiro, imunizou 2,1 milhões, 2% do total da população brasileira. Isso considerando o país que tem a maior capacidade de vacinação do planeta, mas atualmente enfrenta desinformação, incompetência e dificuldade de acesso a insumos básicos para produção de vacinas, em decorrência das bizarrices diplomáticas protagonizadas por Jair Bolsonaro e seu chanceler Ernesto Araújo.
Enquanto isso, nas bandas do extremo Oeste da Amazônia, a pandemia segue padrão natural do contágio, e, no estado do Acre, são 139.248 casos notificados, com 88.542 (63,6%) casos descartados e outros 49.944 (35,9%) confirmados (6%) do total da região norte e outros 762 (0,5%) seguem aguardando resultado de exame laboratorial (Mapa 3) e (Gráfico 1).
Seguindo as medidas de restrição, o governo da capital acreana, comandado pelo prefeito recém-eleito Tião Bocalom (PP), continuou alinhado às medidas tomadas pelo governo estadual para reduzir o número de infectados. O governo do Acre implementou o Plano Estadual de Vacinação e administrou cerca de 5.799, de acordo com o vacinômetro do estado, com os imunizantes entregues em todos os municípios representando 0,65% da população acreana. Vale lembrar que o estado atualiza os dados de doses administradas semanalmente. No cenário nacional, até o dia 4 de fevereiro, o Acre figura como último estado brasileiro no ranking de vacinação.
Ainda assim, assistindo o drama no estado vizinho, o governador solicitou fechamento e/ou imposição de barreiras sanitárias das fronteiras com o Amazonas, e pediu ao Itamaraty o fechamento das fronteiras internacionais com Peru e Bolívia. Em últimas ações de contenção, executando as ações do “Pacto Acre sem COVID”, instituído no Decreto nº 6.206, de junho de 2020, subiu o nível de risco de todas as regionais de saúde no nível de emergência (cor vermelha) e alterou o Decreto nº 5.496, de 20 de março de 2020. Fato que restringiu atividades em bares, restaurantes, academias e até as escolas municipais e estaduais que estavam ensaiando uma retomada de atividades presenciais.
Nesse ponto, sobre o “Pacto Acre sem COVID”, o que deve ser debatido é o seguinte: sem imunização em massa, campanha de informação e conscientização da população sobre os cuidados a serem tomados, a pandemia levará mais tempo para passar, com ou sem pacto em qualquer unidade federativa, já que o patógeno não respeita as fronteiras administrativas e, assim, o país ficará nessa ciranda de cores nas regionais de saúde, mais parecida com um longo delírio regional, sem auxílio emergencial, taxa de desemprego em 14%, menor disposição da população para os lockdowns, economia extremamente fragilizada.
No Acre, embora sejam inúmeros os esforços coordenados entre as esferas municipais e estadual, implementando as políticas públicas setoriais para conter a contaminação e achatar a curva epidemiológica, elas colidem diretamente com a irresponsável condução das medidas, durante a pandemia, por parte do Poder Executivo Federal. Enfim, o esforço deve ser concentrado na vacinação já em curso no país e na vigilância epidemiológica e molecular para rastrear a variante mais transmissível do vírus. O obstáculo será compreender a regionalidade da covid-19 no Brasil, ainda que a agenda do governo federal esteja mais focada na aquisição de leite condensado e os deputados do Centrão do que as doses de vacinas necessárias para imunizar os brasileiros.
* Cristovão Henrique é Geógrafo e Internacionalista – Professor do Curso de Geografia do CFCH – Centro de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal do Acre (UFAC). E administra o site geoeconomico.com.br
Referências bibliográficas:
Boletim Sesacre – 04/02/21 Boletim informativo diário situação epidemiológica da COVID-19 – https://bit.ly/3pM97VC
RIBEIRO SILVA, C.H.. A GUERRA DA VACINA E DOS LUGARES. O Estado de S. Paulo (Estadão), São Paulo, p. 1 – 1, 22 jan. 2021. – https://bit.ly/363U0PK
Data SUS – COVID-19 – Ministério da Saúde Insumos – https://covid.saude.gov.br/
IBGE – Cidades – Rio Branco – https://bit.ly/3caJcjA
Institute for Health Metrics and Evaluation (IHME) – https://covid19.healthdata.org/brazil/acre
Para conter avanço da Covid-19, Gladson Cameli solicita fechamento das fronteiras e divisas do Acre – https://bit.ly/3j8crIk
Mapa da vacinação contra Covid-19 no Brasil – https://bit.ly/39U96K2